segunda-feira, 30 de novembro de 2009

"O imaginário não alcança o Real,
não produz tantos imprevistos.
No caminhar da análise percebe-se a delícia que é abandor o imaginário e supreender-se com o Real e com a vida." Andressa Furquim

Mistério do desejo



"Vale ainda mencionar o estranho silêncio, nos consultórios dos analistas, em torno do eterno mistério do desejo e da diferença sexual. A falta de objeto que caracteriza a atração erótica parece ter sido ofuscada pela onipresença de imagens sexuais nos outdoors, na televisão, nas lojas, nas revistas – por onde olhe, o sujeito se depara com o sexual desvelado que se oferece e o convida. As fantasias sexuais são todas prêt-à-porter. Seria ok, se o suposto desvelamento do mistério não produzisse sintomas paradoxais. O tédio, em primeiro lugar, entre jovens que se esforçam desde cedo para dar mostras de grande eficiência e voracidade sexuais. As intervenções cirúrgicas no corpo, de consequências por vezes bizarras, em rapazes e moças que pensam que a imagem corporal perfeita seja a solução para o mistério que mobiliza o desejo. A reificação do sujeito identificado como mais uma mercadoria se revela no medo generalizado de não agradar.
O mistério do desejo persiste, assim como não deixa de existir o inconsciente: mas é como se suas manifestações não interrogasem mais os sujeitos." (Kehl

quinta-feira, 26 de novembro de 2009


A linha divisória entre homens e mulheres, pelo visto, perdeu sua antiga fixidez, trazendo mobilidade e liberdade para ambas as partes. Se o falo não é um pênis e sim um significante, seu manejo está franqueado a homens e mulheres. Só que, ao insistir em sustentar a equação pênis=falo, os homens acabam por se colocar em uma posição muito mais frágil do que as mulheres. Estas recém descobriram, por conta da própria psicanálise, que o órgão masculino só possui o valor fálico que elas lhe conferirem.



Não é impossível então, que na medida em que as mulheres se livraram de algumas restrições sexuais e existenciais impostas pela moral vitoriana, a linha demarcatória entre a masculinidade e a feminilidade tenha se deslocado – forçando os homens, por enquanto, a jogar na defensiva. Freud já havia percebido a existência de um hiato na complementariedade imaginária entre homens e mulheres, a ponto de perguntar a sua amiga Marie Bonaparte: mas afinal, o que quer uma mulher? Pergunta que repercutiu em todas as geraçaões de psicanalistas, sobre tudo homens. Ora: é claro que ninguém pode saber o que deseja uma mulher. O desejo é, por definição, inconsciente. Um homem também desconhece seu próprio desejo.

(Maria Rita Kehl)

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Histerica x Obsessivo - O corpo.


"Quantas vezes em nossa clínica nos deparamos com mulheres, jovens ou não, de grande beleza, que de imediato se percebe não ter para elas o menor valor? Carregam a beleza assim, como se fosse apenas mais um fardo que as impedisse de passar desapercebidas. Isso é para matar de inveja a histérica, cuja beleza, natural ou não, tem sempre que ser reconstruída diante do espelho, tomando como referencial esse ângulo de visão outro, que em vão a orienta sobre quais imperfeições corrigir, sem que ela pareça jamais conseguir disfarçar o defeito. Já que o defeito que afeta o corpo da histérica refere-se a uma falha, à tomada imaginária de uma falta, enquanto parece que o corpo do obsessivo, aos seus olhos, padece de um excesso.




Uma jovem analisante falava outro dia de suas "ganas de matar" a irmã mais nova. O que a exasperava, eram as horas que ela própria passava se arrumando - "se produzindo"- era a expressão, aliás que parece perfeita, entre outras razões, porque como numa produção de teatro, ela também escolhia o guarda-roupa, os adereços, de acordo com o personagem. Isso, para no fim sair sua irmã "de cara lavada, sem nem se olhar no espelho" indignava-se ela, "parecendo uma princesa de contos de fada". Se o nosso tema fosse a histeria, este fragmento nos daria um bom viés par abordar o problema da reivindicação. Mas, em se tratando de obsessão, cabe a pergunta: por quê uma moça dispensaria os recursos que lhe permitiriam destacar seus atributos? Eu diria que não é garantido que a beleza não possa ser vivida por ela, às vezes como inútil ou mesmo ofensiva. Creio que seria assim porque uma beleza "em excesso" é algo que irrompe aos olhares, que se sobressai, põe em relevo esse corpo que a obsessiva, talvez o obsessivo em geral gostaria de ver absorvido numa topografia mais plana, mais simétrica e sem acidentes que convoquem demasiado o olhar."


(Angela Valore - O Corpo na Neurose Obsessiva.)

sábado, 21 de novembro de 2009


Oferecendo um tratamento pela via do desejo, a psicanálise torna possível para o sujeito o caminho que parte da dor de existir e segue em direção à alegria de viver. Para isto, todavia, é necessário que o sujeito queira saber, tendo a coragem de se confrontar com a dor que morde a vida e sopra a ferida da existência, a fim de fazer da falta que dói, a falta constitutiva do sujeito”

(Quinet)

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

"Não poríamos a mão no fogo pelas nossas opiniões: não temos assim tanta certeza delas. Mas talvez nos deixemos queimar para podermos ter e mudar as nossas opiniões."
(Friedrich Nietzsche).
"É necessário ter o caos aqui dentro para gerar uma estrela." (Nietzsche)
"A capacidade de estabelecer “relações de compreensão” que correspondam a uma “intencionalidade” a partir de uma “imagem ideal do eu”; os progressos individuais condicionados ao progresso dialético do pensamento; a capacidade de reconhecer a si mesmo como responsável pelas consequências de suas escolhas e seus atos e responder por eles perante a comunidade – nossos atos “nos pertencem e nos seguem”, escreve Lacan – capacidades adquiridas ao longo de uma vida em que o sujeito representa a si mesmo como autor de seu destino, tudo isso compõe a personalidade. “O que se entende quando se afirma que alguém tem personalidade”, afirma Lacan, tem a ver com a autonomia da conduta daquele que se responsabiliza perante os demais tanto por suas intenções quanto pelas consequências de seus atos." (KEHL)
Ao Real impossível de Lacan os agrupamentos humanos respondem com a criação social de uma realidade que funciona, organiza os lugares e os poderes, nos permite viver e conviver. Uma realidade social que também é criadora de subjetividade, já que o sujeito só emerge do puro estado de corpo/coisa em que vem ao mundo ao ser inserido pelo Outro nas práticas discursivas – não necessariamente palavreiras – do mundo a que pertence. (KEHL,M.R.)

segunda-feira, 16 de novembro de 2009


"Todo o efêmero
é apenas uma aparência.
O inacessível
aqui se torna acontecimento.
O indescritível
aqui é feito.
O Eterno-Feminino
para o alto nos arrasta."

Goethe

sábado, 14 de novembro de 2009

"O psicanalista, suscitando a verdade do sujeito, suscita ao mesmo tempo o sujeito e a sua verdade." (DOLTO)

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

"Durante o sono, o sujeito que sonha se encontra em linha direta com o
Outro na medida em que o inconsciente é o discurso do Outro.
No pesadelo, o sujeito desperta em estado de angústia, por perceber que
está sendo esmagado e reduzido à condição de objeto de gozo do Outro."

(Jaime Betts)

quinta-feira, 12 de novembro de 2009


"O tempo nos pertence – mas de maneira geral, não somos capazes de simplesmente estar nele. Assim “nós o matamos, o dissipamos, o desperdiçamos ”. Ao descartá-lo como um “tempo que passa”, ao nos fechar para o “fluxo da duração”, acabamos por nos instalar, não no tempo do tédio, mas no da estagnação. O tempo estagnado, “fechado para o fluxo da duração”, é o tempo do presente absoluto – tempo do esquecimento, portanto. “...com o passado essencial caindo em esquecimento, fecha-se o horizonte possível para toda anterioridade. O agora só pode permanecer agora .” Ora: o bloqueio do passado compromete também a fantasia do futuro." (Kehl, M. R.)

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

"Ontem você estava aqui
sentado ao meu lado
quieto, silencioso, parado...
Você é meu traço,
meu rabisco, meu rascunho.
Uma fita, um laço.
Seu colo meu descanço,
seu ombro, meu cansaço.
No seu colo eu me desfaço,
e me recomponho
atrás de seus passos.
Com você eu sou completa,
habitada e deserta.
Sem você eu sou vazia
desacompanhada e sozinha.
E hoje assim estou.
Você se foi, me deixou
Não sei se por penitência ou pecado
Só sei que ontem eu estava inteira
com você ao meu lado."

domingo, 8 de novembro de 2009


"Já escondi um AMOR com medo de perdê-lo, já perdi um AMOR por escondê-lo. Já segurei nas mãos de alguém por medo, já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos. Já expulsei pessoas que amava de minha vida, já me arrependi por isso. Já passei noites chorando até pegar no sono, já fui dormir tão feliz, ao ponto de nem conseguir fechar os olhos.Já acreditei em amores perfeitos, já descobri que eles não existem.Já amei pessoas que me decepcionaram, já decepcionei pessoas que me amaram.


Já menti e me arrependi depois, já falei a verdade e também me arrependi. Já fingi não dar importância às pessoas que amava, para mais tarde chorar quieta em meu canto. Já sorri chorando lágrimas de tristeza, já chorei de tanto rir. Já acreditei em pessoas que não valiam a pena, já deixei de acreditar nas que realmente valiam.


Já gritei quando deveria calar, já calei quando deveria gritar. Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns, outras vezes falei o que não pensava para magoar outros. Já fingi ser o que não sou para agradar uns, já fingi ser o que não sou para desagradar outros.


Já cai inúmeras vezes achando que não iria me reerguer, já me reergui inúmeras vezes achando que não cairia mais. Já liguei para quem não queria apenas para não ligar para quem realmente queria. Já corri atrás de um carro, por ele levar embora, quem eu amava.


Já chamei pessoas próximas de "amigo" e descobri que não eram... Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais para mim."


(adaptações de Clarice Lispector).

SAUDADES

"Sinto saudades de tudo que marcou a minha vida.
Quando vejo retratos, quando sinto cheiros,quando escuto uma voz, quando me lembro do passado,eu sinto saudades...
Sinto saudades de amigos que nunca mais vi,de pessoas com quem não mais falei ou cruzei (...)
Sinto saudades do presente,que não aproveitei de todo,lembrando do passado e apostando no futuro...Sinto saudades do futuro,que se idealizado,provavelmente não será do jeito que eu penso que vai ser...
Sinto saudades de quem me deixou e de quem eu deixei! De quem disse que viria e nem apareceu; de quem apareceu correndo, sem me conhecer direito, de quem nunca vou ter a oportunidade de conhecer.
Sinto saudades dos que se foram e de quem não me despedi direito! Daqueles que não tiveram como me dizer adeus; de gente que passou na calçada contrária da minha vida e que só enxerguei de vislumbre!
Sinto saudades de coisas que tive e de outras que não tive mas quis muito ter! Sinto saudades de coisas que nem sei se existiram. (...)
Sinto saudades das coisas que vivi e das que deixei passar, sem curtir na totalidade.
Quantas vezes tenho vontade de encontrar não sei o que...não sei onde...para resgatar alguma coisa que nem sei o que é e nem onde perdi..."
(Clarice Lispector)

Não Entendo!


"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo."
(Clarice Lispector).

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

"O amor é uma alegria que acompanha a idéia de uma causa exterior." (Spinoza).
"Contentem-se em aceitar sua singularidade."

(Lacan, 1960)

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Paixão e Amor

"É interessante, então, fazer uma distinção entre paixão, sentimento intenso e súbito, arrebatador, que domina a vontade e distorce a percepção objetiva, em que o objeto amado resulta mais da projeção de nossos impulsos e fantasias do que sua real condição, estado amoroso muito próximo do narcisismo e da onipotência, na qual qualquer manifestação do “outro”, como pessoa real, pode produzir uma “fúria narcísica”, estado de duração habitualmente efêmera, que poderá resultar ou não no amor. O amor é, em contraste, uma relação em que a escolha do objeto se dá de uma maneira mais real, de um curso mais lento e duradouro, no qual o respeito pelo “outro”, incluindo a aceitação das limitações deste, poderá ser melhor tolerado."

(OUTEIRAL)