quarta-feira, 29 de setembro de 2010
domingo, 26 de setembro de 2010
O passado é um lugar seguro
"[...] Bons tempos é o nome que damos ao passado – qualquer passado. São os bons tempos, é o nosso tempo. Passei a adolescência e parte da juventude sob a ditadura militar, e isto não impede que me pegue com freqüência a acalentar uma estranha utopia em retrospecto, de que “no meu tempo” a vida tinha mais graça. De todas as formas de escapismo inventadas pelos homens para suportar o osso duro da vida real, talvez o mais inconsciente seja a idealização do passado. Direita e esquerda, conservadores e progressistas cultivam, cada um à sua maneira, o mito de seus bons tempos. Isto é mais grave para a esquerda, que se arrisca a cultivar as utopias que já (não) foram. Mas não é de hoje que tudo fica cada vez pior aos olhos das gerações presentes. “Esse mundo tá perdido, sinhá!” – era o bordão da ex-escrava “tia Anastácia” nos livros infantis de Monteiro Lobato.
O mundo globalizado volta-se todo para o futuro. A vida imita a urgência das apostas antecipadas que cria as tais bolhas de não-riqueza do capital financeiro. A tecnologia aponta para a superação de todas as descobertas, que já nascem com os dias contados, fadadas à obsolescência. Chamamos de progresso a essa forma de vida breve das coisas, fruto do trabalho humano que envelhece tão rapidamente quanto elas.
O presente é uma partícula mínima de tempo, cada vez mais comprimida entre o que já foi e o que será. A rigor, pensem bem: o presente não existe. O futuro é um lugar gelado onde não vive ninguém, de onde só nos acenam promessas de velocidade. A depender das tecnociências hoje, no futuro nos deslocaremos ainda mais depressa, nos comunicaremos mais depressa, ganharemos e perderemos dinheiro mais depressa – e tentaremos envelhecer mais devagar.
O passado tornou-se o único terreno seguro onde a imaginação pode armar sua tenda e contemplar o mundo em relativa tranqüilidade. Na vida em retrospecto, todas as nossas escolhas teriam sido corretas. Teríamos sido abolicionistas no século XIX, modernistas nos anos 1920, resistentes antifascistas em 1930-40, opositores firmes contra as duas ditaduras brasileiras. O passado nos poupa da dimensão trágica da escolha.
Mas é no presente que o corpo está vivo. No presente é que se jogam os lances de dados do destino. Ele é tudo o que temos – e nos escapa."
Maria Rita Kehl
O mundo globalizado volta-se todo para o futuro. A vida imita a urgência das apostas antecipadas que cria as tais bolhas de não-riqueza do capital financeiro. A tecnologia aponta para a superação de todas as descobertas, que já nascem com os dias contados, fadadas à obsolescência. Chamamos de progresso a essa forma de vida breve das coisas, fruto do trabalho humano que envelhece tão rapidamente quanto elas.
O presente é uma partícula mínima de tempo, cada vez mais comprimida entre o que já foi e o que será. A rigor, pensem bem: o presente não existe. O futuro é um lugar gelado onde não vive ninguém, de onde só nos acenam promessas de velocidade. A depender das tecnociências hoje, no futuro nos deslocaremos ainda mais depressa, nos comunicaremos mais depressa, ganharemos e perderemos dinheiro mais depressa – e tentaremos envelhecer mais devagar.
O passado tornou-se o único terreno seguro onde a imaginação pode armar sua tenda e contemplar o mundo em relativa tranqüilidade. Na vida em retrospecto, todas as nossas escolhas teriam sido corretas. Teríamos sido abolicionistas no século XIX, modernistas nos anos 1920, resistentes antifascistas em 1930-40, opositores firmes contra as duas ditaduras brasileiras. O passado nos poupa da dimensão trágica da escolha.
Mas é no presente que o corpo está vivo. No presente é que se jogam os lances de dados do destino. Ele é tudo o que temos – e nos escapa."
Maria Rita Kehl
sexta-feira, 24 de setembro de 2010
Conversa com educadores
O estudo da gramática não faz poetas. O estudo da harmonia não faz compositores. O estudo da psicologia não faz pessoas equilibradas. O estudo das "ciências da educação" não faz educadores. Educadores não podem ser produzidos. Educadores nascem. O que se pode fazer é ajudá-los a nascer. Para isso eu falo e escrevo: para que eles tenham coragem de nascer. Quero educar os educadores. E isso me dá grande prazer porque não existe coisa mais importante que educar. Pela educação o indivíduo se torna mais apto para viver: aprende a pensar e a resolver os problemas práticos da vida. Pela educação ele se torna mais sensível e mais rico interiormente, o que faz dele uma pessoa mais bonita, mais feliz e mais capaz de conviver com os outros. A maioria dos problemas da sociedade se resolveria se os indivíduos tivessem aprendido a pensar. Por não saber pensar tomamos as decisões políticas que não deveríamos tomar. Se você desejar saber com detalhes o que penso sobre a educação, leia os livros que se encontram na sala Biblioteca. Nas minhas conversas com educadores meus temas favoritos são: A alegria de ensinar, A educação dos sentidos, O prazer de ler, A arte de pensar, O educador como sedutor, O educador como feiticeiro, O educador como artista, O educador como cozinheiro, As leis do pensar criativo, Anatomia do pensamento: informação, razão, inteligência, conhecimento, alegria, Aprendendo a desaprender, Entre a ciência e sabedoria: o dilema da educação, Educação e política, Educação e Vida, Aprendizagem e prazer.Leia o artigo Como amar uma criança sobre o educador Janusz Korczak, que se tornou um símbolo pelo seu amor às crianças. Diretor de um orfanato em Varsóvia, foi morto pelos nazistas com suas crianças numa câmara de gás. Tradução de Manoel Moraes.
(Rubens Alves)
O estudo da gramática não faz poetas. O estudo da harmonia não faz compositores. O estudo da psicologia não faz pessoas equilibradas. O estudo das "ciências da educação" não faz educadores. Educadores não podem ser produzidos. Educadores nascem. O que se pode fazer é ajudá-los a nascer. Para isso eu falo e escrevo: para que eles tenham coragem de nascer. Quero educar os educadores. E isso me dá grande prazer porque não existe coisa mais importante que educar. Pela educação o indivíduo se torna mais apto para viver: aprende a pensar e a resolver os problemas práticos da vida. Pela educação ele se torna mais sensível e mais rico interiormente, o que faz dele uma pessoa mais bonita, mais feliz e mais capaz de conviver com os outros. A maioria dos problemas da sociedade se resolveria se os indivíduos tivessem aprendido a pensar. Por não saber pensar tomamos as decisões políticas que não deveríamos tomar. Se você desejar saber com detalhes o que penso sobre a educação, leia os livros que se encontram na sala Biblioteca. Nas minhas conversas com educadores meus temas favoritos são: A alegria de ensinar, A educação dos sentidos, O prazer de ler, A arte de pensar, O educador como sedutor, O educador como feiticeiro, O educador como artista, O educador como cozinheiro, As leis do pensar criativo, Anatomia do pensamento: informação, razão, inteligência, conhecimento, alegria, Aprendendo a desaprender, Entre a ciência e sabedoria: o dilema da educação, Educação e política, Educação e Vida, Aprendizagem e prazer.Leia o artigo Como amar uma criança sobre o educador Janusz Korczak, que se tornou um símbolo pelo seu amor às crianças. Diretor de um orfanato em Varsóvia, foi morto pelos nazistas com suas crianças numa câmara de gás. Tradução de Manoel Moraes.
(Rubens Alves)
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
Amor e Tragédia
Por que será que as grandes histórias de amor são sempre trágicas?
Essa semana, ao me deparar com essa foto de Romeu e Julieta me fiz esse questionamento. No entanto o que mais me intrigou ao pensar sobre isso, não foram as conhecidas tragédias amorosas da ficção, mas o caráter trágico das histórias de amor da vida real, do dia-a-dia. Histórias que vivemos, que temos notícias e que certamente viveremos ainda.
As canções, dos mais variádos gêneros musicais -do pagode ao rock -, os poemas, as esculturas, pinturas, peças de teatro e tantas outras manifestações carregam sempre um traço de tragédia quando se trata do amor.
Mas o que haveria então de tão trágico no amor?
Se pensarmos que nossa constituição subjetiva, aquilo que nos tornará sujeitos - falantes, pensantes, desejantes -, começa quanto somos inundados por uma enorme sensação de satisfação e de prazer da qual nunca mais poderemos nos saciar, que nunca mais será reencontrada e que apartir daí só haverão tentivas de substituir esse primeiro encontro com o objeto que foi perdido .... podemos imaginar por onde passa essa questão.
Avançando um pouco mais aos anos da infância que se seguem apartir de nosso nascimento, nos deparamos com o tempo da grande tragédia Edípica. Na fase em que nossa maneira de nos relacionarmos está em plena formação, somos atravessados pela castração para que possamos prosseguir. Definitivamente haverá apenas as substituições para tudo o que foi perdido!
Ao que me parece, AMOR e TRAGÉDIA caminham de mãos dadas!!!
Ana Paula Dilger
terça-feira, 21 de setembro de 2010
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
O que os homens querem de mulher?
que os homens querem da mulher?
(Maria Rita Kehl)
Eu quis lhe dar um grande amor/ mas você não compreendeu/ a vida de um lar (Zeca Pagodinho)
O dia Internacional da Mulher passou longe da minha coluna quinzenal. Assim, vou levar a sério o galanteio dos que dizem “todo dia é dia de vocês” e continuar uma velha conversa que sempre retorna, por volta do 8 de março: afinal, o que querem as mulheres? Sucessivas gerações de homens retomaram a pergunta, desde que Freud confessou sua perplexidade à amiga Marie Bonaparte no começo do século passado.
Se a descoberta freudiana ainda valer e o inconsciente continuar recalcado, o desejo, no sentido radical da palavra, é enigmático para homens e mulheres. Não há distinção de gênero frente à opacidade das representações estranhamente familiares que nos habitam e motivam lapsos, deslizes, sintomas, fantasias. Já no plano das vontades mais pedestres, do destino que damos a essa insatisfação permanente a que se chama vida – talvez aí se possa especular se os homens seriam menos enigmáticos que as mulheres.
Por uma questão de método, vale considerar o ponto de vista dos que, como Freud, se confessam incapazes de satisfazer esses seres ambíguos que somos nós, do sexo feminino. Os homens, talvez para se esquivar da intromissão feminina, declaram ser pessoas fáceis de contentar. Além de sexo, dedicação e carinho (mas sem exagero!) das amadas, querem respeito profissional e, claro, ganhar bem. O que mais? 90% de minha amostragem particular responde: ler o jornal inteiro no domingo, jogar conversa fora com os amigos de bar de vez em quando e ver futebol na TV sem ser interrompidos. Essa opção, há quem troque por uma soneca no sofá.
Parece que com esse pacote de pequenas alegrias, tudo estaria bem. Mas, atenção: as mulheres, convidadas gentilmente a não aporrinhá-los durante suas atividades favoritas, devem estar a postos quando eles solicitarem. O casamento para o homem, disse uma vez Mário Prata, significa botar uma mulher dentro de casa. E depois, sair prá rua. Só que ela precisa estar lá quando o cara voltar, de preferência sem questionar por que ele saiu em vez de se contentar com tudo o que ela tem a oferecer. Melhor fazer essa pergunta ao ex-marido da Amélia, aquela dedicada que ele abandonou em troca da outra, cheia de exigências.
Mas perguntemos também, como meu colega de coluna, Marcelo Paiva, por que tantas mulheres hoje (nem todas! só as de 40 prá cima) não querem mais se casar. Essa pergunta é simétrica àquela formulada pelo historiador da revolução francesa, Jules Michelet, aos homens que no final do século XIX preferiam as aventuras do celibato à responsabilidade do casamento. Michelet lamentava o destino das moças pobres e remediadas que, fora da instituição do matrimônio, ficavam desprotegidas, vulneráveis, sem perspectiva de futuro.
A recusa mudou de lugar? Por que as mulheres de hoje, cumprida a etapa inicial da criação dos filhos, preferem não entrar num segundo ou um terceiro casamento? Hipótese: porque não precisam mais dele. Não do homem, nem do amor: do casamento. Nem todas as que desistem de casar de novo são, como pensa Marcelo, desiludidas com o amor. As mulheres que já se casaram algumas vezes podem ter desistido do casamento porque este existe, até hoje, para tornar confortável a vida – dos homens. Separados, eles procuram imediatamente uma esposa que substitua a primeira, enquanto elas parecem não ter pressa nenhuma de voltar ao estado civil anterior. Isso não quer dizer que tenham desistido de amar. Pode ser que estejam à procura de outras coisas, alem das que o casamento proporciona. Aliás: é nessa hora, quando uma mulher não se contenta mais com o que seu homem lhe oferece, que ele a acusa de não saber o que quer.
Muitas coisas os homens podem nos dar. Amor, prazer, carinho, apoio. Aquele olhar de desejo que embeleza a mulher. E filhos, quase todas queremos os filhos. O que mais? Profissão e independência econômica ficam fora do pacote do amor. Poder, também: mas o verbo é mais instigante que o substantivo. As mulheres querem poder muitas coisas. Depois que os filhos crescem e antes que lhes tragam netos prá cuidar, o que querem as mulheres? É simples: tudo o que não puderam viver até então. Está certo: tudo, tudo, não pode ser. Vá lá, quase tudo. Com vocês ou sem vocês, meus caros; quase tudo. Caberia até perguntar: por que os homens (não todos! só os de 40 prá cima) querem tão pouco?
Basta olhar à sua volta. Uma fila de cinema: 60% de mulheres, 40% de homens (os jovens talvez sejam exceção). Um concerto? 70% prá nós. Exposição de arte, idem. Metrô prá qualquer lugar, fora de horários de pico: mulheres, mulheres. Carnaval, festa-baile: olha lá elas dançando, com ou sem parceria masculina. Viagens, ecoturismo, passeatas - a lista é longa.
Por isso mesmo a mulher pode hoje dar a seu parceiro o que nenhuma geração anterior ao século XX podia dar. Aquilo que o poeta francês Benjamin Pérec chamou de amor sublime: o amor da carne, mais o da sublimação. As três últimas gerações de mulheres, não limitadas ao espaço doméstico, são capazes de conversar sobre quase tudo com seus companheiros. Compartilhar idéias, projetos, ambições, bobagens, piadas, boemia, lutas. A vida pode ser bem boa desse jeito, e o amor, uma conversa sem fim.
O filósofo romeno Cioran afirmou que as mulheres são as novas-ricas do mundo da cultura. Talvez por isso falemos demais. Em compensação, os maridos não são mais os nossos únicos interlocutores.
quarta-feira, 15 de setembro de 2010
DE BATOM E SALTO ALTO - novos tempos para a sexualidade feminina.
O lugar que a mulher ocupa em nossa sociedade vem sofrendo muitas alterações. A mulher há algumas décadas era educada para ser cuidadora do lar, esposa e mãe. Hoje em dia ela vem conquistando seu espaço no mercado de trabalho e em atividades diversas.
Esses movimentos de mudança tiveram efeitos em sua sexualidade e na sua maneira de se relacionar.
Historicamente o casamento foi considerado o rito social que, entre outras coisas, autorizava socialmente a mulher à sua entrada na vida sexual. Após unir-se civil e religiosamente a um homem ela estava autorizada a relacionar-se sexualmente e a ter filhos.
Foi no período, pós-segunda guerra, que as mulheres começaram a sair de suas casas e a ocupar as fábricas. Muitos de seus maridos que eram provedores do lar não retornaram e elas precisaram ser as provedoras.
Atualmente encontramos sua forte atuação no mercado de trabalho e sua presença nas universidades. Tivemos a invenção da pílula anticoncepcional e da camisinha.
Esses fatores permitiram a ela expressar seu desejo por outras coisas. Foram libertas de seu único destino que era o de se casar e ter filhos. Estudar, concluir a faculdade, ter uma carreira bem sucedida, têm se tornado suas prioridades. O típico relacionamento conjugal está ficando cada vez mais para depois da conquista dos anseios profissionais, sendo uma de suas opções.
Agora há a possibilidade dela poder exercer sua sexualidade conservando seu estado civil de solteira. Não há mais a exigência social do casamento como ato inaugural à sua vida sexual.
Esses movimentos de mudança tiveram efeitos em sua sexualidade e na sua maneira de se relacionar.
Historicamente o casamento foi considerado o rito social que, entre outras coisas, autorizava socialmente a mulher à sua entrada na vida sexual. Após unir-se civil e religiosamente a um homem ela estava autorizada a relacionar-se sexualmente e a ter filhos.
Foi no período, pós-segunda guerra, que as mulheres começaram a sair de suas casas e a ocupar as fábricas. Muitos de seus maridos que eram provedores do lar não retornaram e elas precisaram ser as provedoras.
Atualmente encontramos sua forte atuação no mercado de trabalho e sua presença nas universidades. Tivemos a invenção da pílula anticoncepcional e da camisinha.
Esses fatores permitiram a ela expressar seu desejo por outras coisas. Foram libertas de seu único destino que era o de se casar e ter filhos. Estudar, concluir a faculdade, ter uma carreira bem sucedida, têm se tornado suas prioridades. O típico relacionamento conjugal está ficando cada vez mais para depois da conquista dos anseios profissionais, sendo uma de suas opções.
Agora há a possibilidade dela poder exercer sua sexualidade conservando seu estado civil de solteira. Não há mais a exigência social do casamento como ato inaugural à sua vida sexual.
Muito se discute se essas mudanças e os seus resultados foram positivos ou negativos para a vida afetiva, para os relacionamentos e para as estruturas familiares.
É certo que cada escolha implica em uma (e muitas vezes mais que uma) renúncia. A mulher ao ganhar tanto espaço na sociedade também teve que se haver com aspectos nunca antes enfrentados.
As duplas e triplas jornadas de trabalho, a criação dos filhos e tantos preconceitos que permeiam nossa cultura são alguns exemplos disso.
Vivemos em um momento de diferente organização social ao que nossos pais e avós conheceram. Essa nova organização traz, como um de seus efeitos, certa autonomia ao exercício da sexualidade feminina.
Há a possibilidade dela se relacionar “apesar dê” e não mais “por causa dê”. Pois agora ela pode se unir a alguém se isso for de sua vontade “apesar dê” poder não se unir a ninguém. Não mais “por causa dê” algum outro motivo, ou de algo que ela não possa conquistar, ou que não lhe seja permitido socialmente. As relações podem ser construídas com muito mais honestidade e verdade.
No entanto, como será que os homens têm encarado os avanços e as conquistas femininas?
Bom, essa reflexão vai ficar para uma outra edição!
(Ana Paula Dilger, publicado em julho/2010, em: http://www.portalmex.com.br/).
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
“Essa é, portanto, a dificuldade: fora criar filhos, o que é, hoje, para um casal, “olhar na mesma direção”? Alguns praticam o amor lendo poesia em voz alta, outros estudam juntos, outros exercem a mesma profissão ou adotam ambos uma nova religião, outros ainda se dedicam a práticas sexuais “diferentes”. Tanto faz. O que importa é que, para existir, um casal precisa inventar e compartilhar uma (longa) aventura. (Contardo Calligaris)
quinta-feira, 9 de setembro de 2010
Todo mundo quer amor
Todo mundo quer amor
O psicanalista e psiquiatra Jorge Forbes* fala que a felicidade amorosa não tem garantia. Ele acredita que buscá-la é obrigação de todos. Mesmo sabendo do risco de se machucar no caminho.
Marie Claire: É impossível ser feliz sozinho?
Jorge Forbes: Todo ser humano necessita de alguém que o incomode, que o desafie todos os dias. Quando acontece o encontro, um acorda o outro e é bom, as pessoas precisam de alguém que as retire do comportamento individualista. A mulher deve ser "a pedra no caminho" do homem, como nos versos de Carlos Drummond de Andrade. É ela quem alerta o homem, porque ele é mais acomodado e ela é mais inquieta. O encontro faz com que os dois tenham motivo para reinventar a vida todos os dias. Mas felicidade dá trabalho.
MC: Fixar-se na falta do parceiro é uma atitude infeliz?
JF: Idealizar que o parceiro é a fonte da felicidade tem dois lados ruins:
1. Enquanto está sem par, a pessoa desvaloriza as outras conquistas da vida, que também são importantes, mas acabam passando despercebidas.
2. Se, por acaso, consegue que seu relacionamento amoroso atinja seu ideal de felicidade, está fadada a perder essa situação, já que nenhum relacionamento é ideal eternamente.
MC: Como realizar o sonho de ser feliz no amor?
JF: Tentar ser feliz é obrigatório. Realizar é uma sorte. Para chegar um pouco mais perto, aí vão alguns lembretes:
1. Não acredite em conselhos que tenham em sua composição a palavra "dever".
2. Esqueça regras pré-concebidas. As formas de satisfação a dois só podem ter uma regra – o comum acordo entre os parceiros.
3. Os parceiros podem contar todas as fantasias amorosas um para o outro: contar sempre, realizar quando der.
4. Jamais tente compreender a felicidade. É preciso suportar o inusitado dela, mesmo se você não compreende o que está acontecendo! Com medo de que a felicidade acabe, as pessoas ficam tentando descobrir a receita para repetir exatamente o que aconteceu, na tentativa de aprisionar o momento feliz. Mas toda vez que se constrói uma prisão, a felicidade acaba.
5. A base da felicidade é o novo, a originalidade. Ela é a possibilidade de viver fora do padrão e de reinventar a vida. Quem ousa tem mais chance de ser feliz.
MC: Dizem que"casamento é loteria". O senhor acha que felicidade é questão de sorte?
JF: Concordo que o amor é um encontro por acaso. A essência do relacionamento não se pode prever e nem medir. Todo balanço pré-nupcial tem um elemento imponderável, por isso os mais velhos costumavam dizer que "quem pensa muito não casa". A razão é simples: é impossível entender plenamente por que se está casando.
MC:A felicidade depende da maturidade?
JF: Isso não garante nada. A maturidade é uma chatice que a civilização impõe. A felicidade é poder manter algo dos 5 anos de idade e não ser taxado de débil mental. Felicidade é a força bruta do desejo, que dá o impulso para que as coisas se realizem.
MC: "Tenho medo da dependência" é outro clichê moderno para fugir da intimidade emocional.
JF: Atrás dessa frase há sempre uma pessoa querendo muito ser dependente. Ao encontrar alguém aparentemente disponível, agarra-se a ela como garantia de segurança emocional, econômica, social, espiritual... mas isso não é felicidade. Há sempre uma diferença radical entre dois parceiros: amor é o nome que se dá à ponte que recobre temporariamente essa distância entre eles. Mas a diferença sempre vai reaparecer, é inevitável. A felicidade é tênue, um encontro provisório. Não é standard, nunca é fixa.
MC:Esperar que a relação seja fonte de felicidade revela uma visão idealizada do amor?
JF: Tratar a relação amorosa como um tapa-buraco para as dificuldades da vida é exigir demais do parceiro, que acaba tendo uma responsabilidade que desconhece e com a qual não pode arcar. Relacionamento amoroso ajuda, sim, mas indiretamente: fornece energia e entusiasmo para enfrentar a vida.
MC:O que precisamos saber para amar e ser feliz?
JF: Que não existe garantia. Todo amor é um contrato de risco e nisso reside sua graça e sua desgraça. Graça, quando contribui para aumentar o entusiasmo na vida. Desgraça quando deixa a pessoa desarvorada – a pior reação de uma mulher frente à perda de um amor, segundo [a escritora] Marguerite Duras.
MC:Mulher sofre mais por amor do que homem?
JF: Geralmente, sim. O abatimento da mulher é maior porque a capacidade feminina de amar é infinitamente superior à do homem.
MC:Felicidade é uma responsabilidade pessoal?
JF: Pessoal e intransferível. Quem espera que o outro lhe traga a felicidade é porque se acomodou. Colocou o parceiro no lugar da mãe que levava o Toddy na cama.
MC:Na carência afetiva, corremos o risco de consumir o outro como um "antidepressivo"?
JF: Transformar amor em remédio é perigoso, felicidade não é artigo de consumo. A relação amorosa tem duas vertentes: a afetiva e a sensual. A afetiva é cuidado, segurança, companheirismo – é repetição. A sensual é invenção e nada tem a ver com o cuidar – envolve surpresa, uso sexual recíproco e tem uma vertente enigmática. Quando as pessoas estão carentes, tendem a desenvolver a corrente amigável e sufocar a sensual. Aí o amor acaba. Quem se preocupa demais com o dia-a-dia costuma fazer mal amor à noite.
MC: A felicidade amorosa quase sempre vem acompanhada do medo da perda, do abandono ou da traição. Como superar isso?
JF: Quando se gosta de alguém, a tendência é ficar vulnerável. Amar é suportar ser ridículo. A partir dos 30 anos as pessoas estão escaldadas, já tiveram decepções amorosas. Daí o medo. Mesmo assim, vale a pena arriscar novamente, ainda sabendo que pode se ferrar de novo. Mas se a pessoa só se ferra, é hora de desconfiar de suas más escolhas. Tem gente que tem prazer em sofrer.
MC: A euforia do começo da paixão pode ser chamada de felicidade?
JF: A paixão pode ser chamada de felicidade, mas, quando se transforma em um ideal de vida, fica supervalorizada e representa um perigo. Fica bonito no teatro, mas é muito triste na vida real. Daí personagens como Romeu e Julieta, Tristão e Isolda, Abelardo e Heloísa... Morreram porque tentaram eternizar a paixão. Quando os envolvidos querem manter intocável a paixão, quando não suportam mudança ou interferência, acabam selando um compromisso de morte.
terça-feira, 7 de setembro de 2010
De erro em erro, vai-se descobrindo toda a verdade."
Não somos apenas o que pensamos ser.
Somos mais; somos também, o que lembramos e aquilo de que nos esquecemos;
somos as álavras que trocamos, os enganos q cometemos,os inpulsos a que cedemos, "sem quere"
"Um dia, quando olhares para trás, verás que os dias mais belos foram aqueles em que lutaste."
Sigmund Freud
domingo, 5 de setembro de 2010
quinta-feira, 2 de setembro de 2010
Um novo ideal masculino
Um novo ideal masculino
por Contardo Calligaris *
publicado em 13/7/2009.
VOCÊ SE lembra de Gordon Gekko, o protagonista do filme "Wall Street - Poder e Cobiça", de Oliver Stone, de 1987? Na Nova York dos anos 90, Gekko foi o ídolo dos que tentavam fortuna no mercado financeiro. Graças a Gekko, eles se sentiam autorizados; repetiam, como um mantra: "A ganância é uma coisa boa".
Gekko juntava num único ideal o sonho de fazer dinheiro e o desejo de viver perigosamente, conciliando as duas figuras tradicionais do ideal masculino: o provedor e o aventureiro (fora ou acima da lei).
Funcionou durante mais de uma década. Uma geração inteira viveu sua cobiça como uma proeza gloriosa: "Olhe, fiz meu primeiro milhão de dólares, e tudo isso na corda bamba. Sou o Philippe Petit das finanças; ele caminhava entre as Torres Gêmeas, enquanto eu avanço no vazio, acima de Wall Street, e logo comprarei para você, mãe, a casa na Flórida que você sempre quis".
A corda era bamba mesmo, e, em sua queda, os aventureiros gananciosos à la Gordon Gekko levaram consigo um monte de pequenos provedores "sem ousadia", que contavam com sua poupança para envelhecer tranquilos. Hoje, em Nova York, ser corretor, mesmo multimilionário, não é um ideal praticável -ao contrário, tornou-se um ofício envergonhado. Com o que sonham, então, os meninos e suas mães?
Em nossas telas, os super-heróis continuam exibindo seus poderes, e há vampiros e lobisomens fascinantes que, às vezes, são "do bem". Todos eles alimentam a esperança de que nosso cotidiano (insosso?) seja apenas uma identidade secreta atrás da qual escondemos algum bizarro heroísmo; mas, convenhamos, eles são distantes demais, são ideais improváveis. Há policiais, bombeiros e militares, mas (hesitam as mães) eles ganham pouco e correm risco de vida. Há bandidos de sucesso, mas você já imaginou contar para amigas e vizinhas que seu filho está na lista dos dez mais procurados pela polícia federal?
Em suma, com o fim de Gekko, falta um ideal masculino que seja distante (como deve ser um ideal), mas mesmo assim alcançável para quem não nasceu em Kripton ou não foi mordido por Drácula - também um ideal que seja honrado e não exponha os meninos a riscos letais.
A eleição de Barack Obama à presidência dos EUA não foi só um marco político; está também transformando os ideais masculinos.
Obama é um paradigma triunfal (a presidência americana, ainda mais para um negro, é façanha de super-herói), mas, ao mesmo tempo, ele é um homem comum, um "americano tranquilo". Ele não esbraveja, conversa com seus adversários, e já foi um ativista social (generoso, portanto). Em Obama, o esporte extremo do poder se concilia com a vida de família mais tradicional: à noite, jogos de mesa com as crianças e, no domingo, serviço religioso. Quando, duas semanas atrás, Barack e Michelle saíram sozinhos para um jantar romântico, Jon Stewart (do "Daily Show") protestou: "Como a gente vai competir com isso?" e apostrofou Obama: "Pega leve, cara" (Folha, caderno The New York Times de 22 de junho). Stewart tem razão: Obama não é só o homem que muitas mães gostariam que seus meninos fossem mas também o homem com quem elas gostariam de casar.
Se esse ideal triunfar na cultura dos EUA (repertório tradicional do heroísmo masculino), ele poderia transformar as aspirações dos meninos pelo mundo afora: saem os justiceiros e os pistoleiros, os astronautas, John Wayne e seus paraquedistas, Burt Lancaster no seu submarino, Robert de Niro e sua roleta-russa, Leonardo di Caprio na proa do Titanic, e entram de vez Gregory Peck de "O Sol é para Todos" ou Sidney Poitier e Spencer Tracy de "Adivinhe Quem Vem para Jantar". O mundo agradeceria.
Claro, ninguém é ingênuo: a mudança acarretaria sua parte de opressão, sobretudo para quem não é muito caseiro, mas essa é outra história.
por Contardo Calligaris *
publicado em 13/7/2009.
VOCÊ SE lembra de Gordon Gekko, o protagonista do filme "Wall Street - Poder e Cobiça", de Oliver Stone, de 1987? Na Nova York dos anos 90, Gekko foi o ídolo dos que tentavam fortuna no mercado financeiro. Graças a Gekko, eles se sentiam autorizados; repetiam, como um mantra: "A ganância é uma coisa boa".
Gekko juntava num único ideal o sonho de fazer dinheiro e o desejo de viver perigosamente, conciliando as duas figuras tradicionais do ideal masculino: o provedor e o aventureiro (fora ou acima da lei).
Funcionou durante mais de uma década. Uma geração inteira viveu sua cobiça como uma proeza gloriosa: "Olhe, fiz meu primeiro milhão de dólares, e tudo isso na corda bamba. Sou o Philippe Petit das finanças; ele caminhava entre as Torres Gêmeas, enquanto eu avanço no vazio, acima de Wall Street, e logo comprarei para você, mãe, a casa na Flórida que você sempre quis".
A corda era bamba mesmo, e, em sua queda, os aventureiros gananciosos à la Gordon Gekko levaram consigo um monte de pequenos provedores "sem ousadia", que contavam com sua poupança para envelhecer tranquilos. Hoje, em Nova York, ser corretor, mesmo multimilionário, não é um ideal praticável -ao contrário, tornou-se um ofício envergonhado. Com o que sonham, então, os meninos e suas mães?
Em nossas telas, os super-heróis continuam exibindo seus poderes, e há vampiros e lobisomens fascinantes que, às vezes, são "do bem". Todos eles alimentam a esperança de que nosso cotidiano (insosso?) seja apenas uma identidade secreta atrás da qual escondemos algum bizarro heroísmo; mas, convenhamos, eles são distantes demais, são ideais improváveis. Há policiais, bombeiros e militares, mas (hesitam as mães) eles ganham pouco e correm risco de vida. Há bandidos de sucesso, mas você já imaginou contar para amigas e vizinhas que seu filho está na lista dos dez mais procurados pela polícia federal?
Em suma, com o fim de Gekko, falta um ideal masculino que seja distante (como deve ser um ideal), mas mesmo assim alcançável para quem não nasceu em Kripton ou não foi mordido por Drácula - também um ideal que seja honrado e não exponha os meninos a riscos letais.
A eleição de Barack Obama à presidência dos EUA não foi só um marco político; está também transformando os ideais masculinos.
Obama é um paradigma triunfal (a presidência americana, ainda mais para um negro, é façanha de super-herói), mas, ao mesmo tempo, ele é um homem comum, um "americano tranquilo". Ele não esbraveja, conversa com seus adversários, e já foi um ativista social (generoso, portanto). Em Obama, o esporte extremo do poder se concilia com a vida de família mais tradicional: à noite, jogos de mesa com as crianças e, no domingo, serviço religioso. Quando, duas semanas atrás, Barack e Michelle saíram sozinhos para um jantar romântico, Jon Stewart (do "Daily Show") protestou: "Como a gente vai competir com isso?" e apostrofou Obama: "Pega leve, cara" (Folha, caderno The New York Times de 22 de junho). Stewart tem razão: Obama não é só o homem que muitas mães gostariam que seus meninos fossem mas também o homem com quem elas gostariam de casar.
Se esse ideal triunfar na cultura dos EUA (repertório tradicional do heroísmo masculino), ele poderia transformar as aspirações dos meninos pelo mundo afora: saem os justiceiros e os pistoleiros, os astronautas, John Wayne e seus paraquedistas, Burt Lancaster no seu submarino, Robert de Niro e sua roleta-russa, Leonardo di Caprio na proa do Titanic, e entram de vez Gregory Peck de "O Sol é para Todos" ou Sidney Poitier e Spencer Tracy de "Adivinhe Quem Vem para Jantar". O mundo agradeceria.
Claro, ninguém é ingênuo: a mudança acarretaria sua parte de opressão, sobretudo para quem não é muito caseiro, mas essa é outra história.
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